quinta-feira, 22 de outubro de 2015

e a vida ainda pulsa

Na semana que se encerra no domingo, dois eventos, que não receberam da mídia o merecido destaque, mostram os caminhos que vão sendo trilhados por brasileiros para a construção de um País mais moderno.
No Nordeste, assolado por uma seca que já dura quatro anos, o Semiárido Show, promovido pela Embrapa e o IRPAA - Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada, mostra como os agricultores familiares tem se apropriado das tecnologias atualmente disponíveis, para uma convivência digna e sustentável com esta contingência climática, que por mais de um século tem contribuído para o aumento da desigualdade da Região.
E no Parque Água Branca, na capital paulista, a 1ª Feira Nacional da Reforma Agrária mostra a importância da reforma agrária na oferta de alimentos saudáveis na mesa do brasileiro e na redução da miséria no campo e do êxodo rural.
Para informações mais detalhadas, deixo aí os links.
Recomendo uma visita.

quarta-feira, 21 de outubro de 2015

uma linda história de amor (ou, juízo de mais é trambolho)


De passagem por Castelo, no Piauí, para visitar o irmão engenheiro, a mocinha foi por ele advertida a não levar a sério a lábia de um tal Baptista (fala-se batista), rapaz festeiro, enxerido e namorador, embora afável e cordial.
Com a curiosidade aguçada, resolve ela mesma tirar a prova no footing da boca da noite, costume das cidades do interior nos finais dos 1930, onde as moças casadoiras e os rapazes solteiros caminhavam pela praça, avaliando suas possibilidades.
Identificando logo o alvo, comenta com suas amigas que aquele mesmo não seria páreo para ela, garantindo que ela o faria facilmente comer na sua mão.
Ele, sempre atento, notara aquela mocinha branca e magrinha chegando na cidade mais cedo, julgando, porém, ser a esposa do engenheiro, que casara recentemente em Minas Gerais. Sua presença naquele ambiente, mostrou o engano e reacendeu sua esperança. 
No dia seguinte, ela partiu no trem com as amigas para Teresina, objetivo final de sua viagem, pois só parara por ali para ver o irmão. Ele resolveu não perder tempo.
Exercia, na época, o ofício de guarda-fio do Telégrafo, função que consistia em inspecionar o estado da linhas telegráficas, entre as estações da estrada de ferro, em lombo de burro. Entre uma viagem e outra foi aprendendo com os amigos telegrafistas o código morse, ficando apto a quebrar o galho de um ou outro, nas eventualidades. Chegara a hora de aproveitar o conhecimento e as relações.
Assim, em cada estação onde ela passava, um longo e derramado telegrama. Habituada à linguagem 'telegráfica' do meio, onde se cobrava por palavra escrita, procura avaliar se ele era muito rico ou estava perdidamente apaixonado.
Responde por cartinhas, das quais também não temos o teor.
Resumindo, em menos de um ano lá estava ele na Caiçara, em Cariré, pedindo a mão da moça em casamento para levá-la pros confins do Piauí. Diante da determinação dos dois, a família cuida dos arranjos para celebrar o casamento, com o Padre Áureo, em Sobral, e lá vão eles pra começar uma vida nova.
Estabelecida em Castelo, enfrenta com galhardia o choro e as maledicências das pretendentes ao marido, incluindo uma pretensa noiva oficial, de nome Ducolina e apelido Ducu. Depois acompanhou o marido pelo Piauí e Ceará, em suas novas funções na Coletoria Federal do Ministério da Fazenda, cujo acesso se deu por concurso público, até sua aposentadoria em Fortaleza.
Ela contava esta história com gosto, a gente escutava embevecido, perguntando pelos detalhes e o marido sorria benevolente. Cada um na certeza de ter enganado o outro.
Ledo engano. Ninguém enganou ninguém em nenhum momento.
Há 25 anos, comemoraram Bodas de Ouro, numa festa de arromba, com a presença de filhos, netos, irmãos, irmãs, sobrinhos, amigos, com tudo o que tinham direito depois de cinquenta anos de amor e cumplicidade. 
Foi a mais linda história de amor, que até hoje eu vi alguém contar...

domingo, 18 de outubro de 2015

o fogo pode queimar

Recebi hoje questionamento por justificar a utilização de queimadas em recente postagem aqui no blog.
Tá certo. Fui reler o blog e constatei ter misturado alhos com bagulhos, mostrando uma visão meio confusa sobre o assunto. E como com fogo não se brinca, me apresso pra colocar as coisas no seu devido lugar.
Embora o domínio do fogo pelo ser humano represente um dos grandes passos de sua evolução, a utilização que tem feito disto nem sempre tem sido das melhores.
Com o conhecimento e ferramentas hoje disponíveis, não exite nenhuma justificativa para o agricultor continuar usando a queimada para o preparo do terreno. No caso de um sistema de agricultura que se pretenda agroecológica ou sustentável é totalmente inadmissível.
Mormente no semiárido nordestino, onde a "fitomassa produzida anualmente não é suficiente para oferecer uma cobertura morta adequada à proteção do solo e manter um nível adequado de matéria orgânica", como ensina o Prof. João Ambrósio. Ressaltando, ainda, que "o intemperismo normal na região consome anualmente cerca de 90% da serrapilheira".
Além dos efeitos prejudiciais aos ecossistemas, as queimadas aumentam a emissão de CO2 na atmosfera, incrementando o "efeito estufa". Sem contar com o perigo que o fogo se alastre pra fora da área do roçado, provocando incêndios nas matas vizinhas, acidente bastante comum.
É deprimente o espetáculo dos rolos de fumaça no sertão quando se olha do talhado da serra ou então subindo as encostas quando se vê do sertão.
Assustador que uma prática tão primitiva e deletéria seja usada ainda costumeiramente por empreendimentos agrícolas de todos os tamanhos e de condições tecnológicas diversas. A foto que ilustra este post é a devastação de uma considerável área no sul do Pará, por uma grande empresa agrícola, dotada de recursos técnicos e financeiros.
A agricultura produtivista, dita moderna, considera o solo um suporte inerte, acreditando poder suprir todas as necessidades das plantas com o aporte de recursos externos, comprados da indústria química. Os técnicos da assistência técnica oficial ou das empresas dão de ombros, alegando ser a forma mais rápida e econômica de limpar uma área. Pudera. A conta vai pra sociedade.
Felizmente, existe na sociedade um sentimento de preocupação com as questões ambientais, ainda difuso, por certo, mas real. E existe uma prática de agricultores familiares, assentamentos da reforma agrária, produtores orgânicos, assistidos por técnicos ligados a ONGs, movimentos sociais e outros setores da sociedade civil, no sentido de mostrar a viabilidade de uma agricultura que se desenvolva junto com a Natureza e não contra ela. Preocupados em produzir alimentos nutritivos e saudáveis. Sabendo que o ser humano é parte do Meio Ambiente e não o seu dono.
Não sei se dá pra ser otimista. Mas não dá pra fugir desta luta.


sábado, 17 de outubro de 2015

A arte de colher o sol

O sol é a fonte de toda a energia e toda forma de vida do nosso planeta. Mas, somente o reino vegetal (plantas, algas) tem a capacidade de transformar a energia pura que recebe do sol em energia química, sintetizando seu próprio alimento.
Todas as outras formas de vida existentes dependem, pois, dos vegetais para sua sobrevivência e reprodução.
Nos primórdios de sua existência, o ser humano, confrontado com esta situação, perambulou pelo Jardim do Éden, coletando frutos, sementes, folhas, flores, raízes enriquecendo a dieta com algum animal distraído que passasse por ali, para garantir sua existência. Esgotada a coleta num local, levantava acampamento e ia em busca de novo pasto.
Nestas andanças, observou que nos sítio por onde passava, em volta dos lugares onde armava as tendas ou nas vizinhanças das cavernas que usava com abrigo, as sementes que caiam ao solo davam origem a novas plantas, iguais às que utilizava para se alimentar.
Pronto. Descobrira a forma de acabar com a canseira das viagens carregando o monte de tralha que todo humano vai juntando pela vida. Era o começo da agricultura.
Pra dar conta de implementar este novo modo de vida teve ainda de aprender com a Natureza todo o processo que levava uma semente, às vezes insignificante, se transformar num vegetal que suprisse a sua necessidade. Foi aluno paciente e atencioso, conseguindo por fim se estabelecer em local propício e largar a vida errante.
Desde o começo desta nova etapa, promoveu uma simplificação no sistema vegetal existente, cultivando umas poucas espécies que atendiam seus objetivos. Sempre podiam coletar outras nas matas e florestas que circundavam os assentamentos humanos.
Para o estabelecimento de seus cultivos, derrubou a floresta com seus machados de pedra, limpando o terreno com o fogo, deixando-o no ponto de receber as sementes que selecionara. Um procedimento usado até hoje, como podemos ver.
Dizem os mais velhos que isso se deu há uns dez mil anos atrás, quando do nascimento do Raul Seixas.
Daí surgiram as cidades, o comércio, a indústria, as profissões especializadas,  a cerca, a propriedade privada e todas as criações humanas que nos conduziram a este estado de progresso e convulsão onde nos encontramos.
No começo, a agricultura tinha por objetivo alimentar o grupamento humano de cada localidade. É de supor que nesta época nossa espécie tenha desenvolvido formas colaborativas e solidárias de convivência, para fazer frente aos desafios de seu entorno, sendo o tão propalado egoísmo humano uma construção perversamente elaborada por grupos que viram neste sentimento uma forma de tirar proveito.
Com o desenvolvimento da Economia, passou-se a enxergar a Agricultura como um setor atrasado, pouco dinâmico, apenas suportado por ser a única forma de produção capaz de produzir alimentos para uma população que não parava de crescer.
E a partir do conhecimento científico de uma parcela mínima e isolada de seu funcionamento, tentou-se modernizá-la dentro de uma lógica industrial, desprezando uma infinidade de seres e processos presentes nos ecossistemas.
Com um arsenal de motosserras, correntões, tratores, desfolhantes, herbicidas destroem ricos ecossistemas, ainda desconhecidos, deixando um rastro de morte, tristeza, exclusão, pobreza, mas frequentando as páginas de economia da imprensa como setor dinâmico e produtivo: o tal do agronegócio.
Um sistema predatório e irresponsável, cujas consequências já são sentidas por todos.
E a gente ainda corre o risco de ver alguma reportagem nos jornais, reproduzida depois por alguns, por ignorância e/ou má fé, acusando os pequenos agricultores de agredir a Natureza, por usar este sistema tão antigo de derrubada e queimada. Por certo, temos hoje o conhecimento de formas mais apropriadas de conduzir os cultivos. Mas o buraco é mais embaixo.
Diz um provérbio chinês que a agricultura é a arte de colher o sol. Tá certo. Colhe-se o resultado da fotossíntese. E qualquer forma de agricultura que ignore sua característica essencialmente biológica está fadado a não ser sustentável. O risco é que só acordemos pra isso quando o desastre for irreversível.


quinta-feira, 15 de outubro de 2015

Falaram do Natal, esqueceram do Menino

Coisas interessantes aconteceram em Ubajara, neste ano de 2015.
A comemoração do Centenário da emancipação política do município, com alguns eventos significativos, boa participação popular e um salutar resgate, por parte dos alunos da escolas municipais das memórias e histórias de suas comunidades.
Os 50 anos do Sindicato dos Trabalhadores Rurais na Agricultura Familiar de Ubajara, relembrando hábitos dos que suaram muito para construir a base econômica desta cidade.
O Desfile do 7 de Setembro envolvendo as forças vivas das comunidades - agricultores familiares, associações comunitárias, escolas públicas e particulares - enfim toda a gente que vive por aqui.
Embora alguns torçam o nariz e o bondinho esteja parado, o CDL promoveu com êxito a sua convenção estadual, lotando a cidade com lojistas de todo o Estado.
Na quarta-feira, o CDL e a Prefeitura Municipal convidaram representantes de todos os segmentos da sociedade local para a apresentação do Projeto do Natal de Luz, no Castelo Clube, que de resto também está bombando em sua programação.
Um destaque: é a primeira vez que vejo, em nossa cidade, a preocupação em programar uma festividade, com um projeto que tenha começo, meio e fim por parte do poder público.
Procura resgatar, incentivar e desenvolver a vocação turística da cidade, através de suas qualidades intrínsecas de paisagem, clima e hospitalidade das pessoas, indo além dos equipamentos como o bondinho, propondo uma nova visão do assunto.
Na apresentação, houve a preocupação de despertar nas pessoas presentes a sua integração com o projeto, assumindo-o como sendo de cada um e da cidade como um todo. Intenção louvável, sem dúvida.
Mas, como de boa intenção o inferno está cheio, cabe questionar alguns pontos.
O primeiro, sem dúvida, é que o projeto já vem pronto. Contratam-se especialistas, evidentemente competentes, que a partir de informações de experiências exitosas em outros lugares, propõem a sua implantação na cidade, ignorando as diferenças econômicas e/ou culturais porventura existentes.
E isso não é um incentivo à participação da comunidade.
Depois, turista não é bobo. Entre uma imitação e o original, ele vai preferir sempre alguma coisa original. Aliás, o turismo se desenvolve pela procura das pessoas de viver experiências únicas e diferentes em cada localidade visitada. Daí, que ele é forte onde existem aspectos culturais marcantes e peculiares. Festas, comidas, edificações, paisagens de cada povo ou comunidade são o atrativo.
Aqui mesmo, em nossa cidade, temos o exemplo da Festa das Flores, que era realizada anualmente pelo Professor Raimundo, como um evento que atraia e movimentava um numeroso contingente de turistas, alguns dos quais acabaram se fixando por aqui.

E o Natal é mais que luzes, árvores, presentes. É a comemoração do nascimento do Menino Jesus, que veio ao mundo com uma mensagem de Amor e Paz entre todas as pessoas.
E talvez tenha sido Ele o grande esquecido da noite.
O resgate de tradições nossas, lapinhas, presépios, novenas, com certeza aumentaria o sentimento de pertencimento de toda a população, atraindo os visitantes ávidos por experiências diferenciadas e únicas.

domingo, 4 de outubro de 2015

"Pregue o evangelho em todo o tempo. Se necessário, use palavras."

Publiquei esta postagem há 3 anos. Acredito que continua atual nos dias que estamos vivendo. Republico-a.

Comemora-se, neste 4 de outubro, nas igrejas católicas do mundo inteiro, o dia de São Francisco, o mais radical seguidor de Cristo.
Aqui, no Ceará, grande festejo em Canindé, centro da devoção franciscana no Nordeste, com sua Basílica que atrai romeiros de todo canto, em busca dos milagres a ele atribuídos.
Algumas poucas paróquias no Estado o têm como padroeiro, mas em todas as cidades que conheço por aqui tem uma igrejinha ou capela de São Francisco, quase sempre localizada nas áreas mais pobres, bem ao feitio do homenageado.
Na novena que antecede a data, grande presença dos devotos, muitos vestidos com o hábito marrom e o cordão que caracteriza os frades franciscanos.
É grande a identificação dos mais humildes e despossuídos com este homem, que mais viveu que pregou as ideias que o animavam. Este boneco de pano, que ilustra o post, mostra bem a visão do povo com um seu igual.
Francisco pregou o Evangelho em todo o tempo de sua vida, desque entendeu a conformidade e o absurdo do comportamento dos bem pensantes da época com a situação injusta da sociedade.
Para ele, o Criador não estava no céu, ou no olimpo, mas ali no meio de todos, refletido em suas criaturas. Com isto, todos os seres e coisas que foram criados por Ele deveriam receber o respeito e o amor que a Ele se deviam dedicar. Atual e revolucionário, por certo.
Acredito que tenha sido canonizado em tão pouco tempo após a sua morte para evitar o contágio de seu exemplo com os seus pares. Santo é outro departamento. Francisco fazia isto porque era santo. Portanto, nada de tentar fazer o mesmo. Só rezar e pedir graças, por sua intercessão.
Francisco é muito atual. As sociedades criadas pelos humanos, muitas vezes invocando o nome de Deus em vão, cristalizaram as desigualdades como fenômenos naturais e não resultado da intervenção dos homens.
Dá pra entender porque só mais de oitocentos anos depois de sua morte um papa resolve adotar o seu nome e tenta resgatar os ensinamentos de Cristo.
Mãe Terra, Irmão Sol, Irmã Lua...
Temos muito a aprender com Francisco.

(Ilustração: escultura feita em tecido, de autoria não identificada, pertencente ao acervo do Seminário Franciscano Frei Galvão, em SP.)

quinta-feira, 24 de setembro de 2015

andando pelo sertão

Semana passada em andanças pelo sertão conversando com as cooperativas da agricultura familiar sobre a sua participação no Programa Nacional de Alimentação Escolar.
"O sertanejo é antes de tudo um forte" proclamava no início do século passado Euclides da Cunha, com um sentido talvez diferente do que a gente entende atualmente.
Mas depois de quatro anos de seca, falta de água, queda de produção, (coisas bem mais fáceis de enfrentar que o desprezo que lhe devota parte da sociedade), é alentador ver que ele não esmorece e vai lutando com coragem e astúcia pra driblar as barreiras que lhe são impostas.
Aí a frase faz sentido.
O Programa Nacional de Alimentação Escolar vem de tempos, desde os 1950 e surgiu da preocupação de um grande brasileiro, muito desconhecido, Josué de Castro com a fome e desnutrição de seus patrícios. Preocupação que não sensibiliza quem sempre dispôs de um prato de comida.
Já foi conhecido como Programa da Merenda Escolar, mas os/as nutricionistas acham que este termo está longe das intenções e grandeza do programa. Coisas de gê ou jota, pois.
Gosto do termo merenda. Tem mais sustança que coffee break, tão usado atualmente praqueles café com bolacha servidos em reuniões técnicas de vários calibres.
Mas, voltando ao Programa, sabemos que ele frequenta o noticiário quase sempre na forma de escândalo, quase nunca pelas milhares de refeições que ele serve todo dia aos estudantes brasileiros, da creche ao segundo grau. Muita gente desconhece.
Como desconhece que uma lei de 2009, que consolida os princípios da alimentação escolar, determina que no mínimo 30% dos recursos repassados pelo FNDE para as escolas, destinados a este programa, devem ser usados para comprar gêneros alimentícios diretamente da agricultura familiar.
Agricultura familiar é aquele segmento que alguns acadêmicos juram não existir, mas que responde por mais de 70% da comida que chega na sua mesa.
Voltaremos a conversar sobre isto.
Por hoje, fiquemos com Patativa do Assaré:
"Eu sou de uma terra que o povo padece
Mas não esmorece e procura vencer.
Da terra querida, que a linda cabocla
De riso na boca zomba no sofrer
Não nego meu sangue, não nego meu nome
Olho para a fome, pergunto o que há?
Eu sou brasileiro, filho do Nordeste,
Sou cabra da Peste, sou do Ceará."

terça-feira, 22 de setembro de 2015

chafúrdia

Um amigo compartilha hoje, no facebook, postagem sobre um poço artesiano cavado em São João do Sabugi, no Seridó do RN.
Morando em Belzonte e conhecendo o Brasil através do que lê na nossa imprensa marrom, certamente desconhece o que vem acontecendo em milhares de localidades país afora para melhorar as condições de vida dos brasileiros mais necessitados.
Não sabe, por exemplo, que este poço faz parte de um conjunto de 200 a se cavar por todo o semiárido pelo Grupamento de Engenharia do Exército e que ao lado da construção de cisternas de placa para abastecimento humano e irrigação (P1MC e P1+2) e das capacitações para utilização racional e reuso de águas servidas tem contribuído para que a seca, que nos castiga há mais de 4 anos, não tenha se transformado numa catástrofe de proporções dantescas. (E tem ainda a distribuição d'água pelos carros pipas, administrada pelo Exército).
Mas já estou desviando o assunto.
O citado amigo faz parte daqueles milhares de brasileiros que postam no face aquelas mensagens raivosas da direita contra a presidenta e contra a normalidade constitucional. Talvez nem tenha se dado conta de que com esta postagem estaria reconhecendo o trabalho do Governo Federal. Como não se dá conta do que está falando quando prega o golpe.
Assim como ele, vejo mais uma porção de gente repetindo feito zumbi as palavras de ordem ditadas pela imprensa sem a menor noção do que estão divulgando.
E tudo gente que teve acesso a escola, tem disponibilidade de internet, alguns falam até outra língua. Mas talvez tenham preguiça de ler, de questionar o que leem, preferindo seguir a moda ditada pelos donos da mídia.
E assim, sem discernimento, vão sendo usados como massa de manobra para tomar o poder.
Em benefício de velhos e conhecidos sacripantas.
 

sexta-feira, 18 de setembro de 2015

Do clima

Uma querida amiga confessa no facebook "Sempre associei caatinga à tristeza, miséria. ...", opinião certamente compartilhada por milhões de brasileiros. Uma imagem da vegetação da caatinga mostrou para ela um outro lado, até então oculto.
Habituado, desda nascença, com as mutações daquela vegetação, de uma exuberância irracional no período da chuva, passando pela troca do verde pelas cores amareladas e marrons, até ficarem apenas os galhos secos das árvores, esperando a próxima chuva para começar tudo outra vez, acordei para o desconhecimento que cultivamos com as coisas de nosso País.



 

Não passa pela cabeça de ninguém associar a neve à tristeza ou miséria. Pelo contrário, ficamos maravilhados com o espetáculo.
No entanto, no inverno rigoroso dos países do Norte as folhas caem, as árvores ficam peladas, os pastos e cultivos ficam cobertos de neve, os animais migram ou hibernam e as criações precisam ser alimentadas com o que se guarda das outras estações.




Então, tristeza, miséria, fome têm outras causas, que não as naturais. São construção humana, de cada sociedade. O ser humano cria condições de viver nos mais diferentes climas do Planeta. Pra compensar, cria as sociedades mais injustas possíveis, responsáveis pelas misérias que vemos estampadas nos meios de comunicação, com hipócrita indignação.
O que vemos no Brasil mostra isso claramente.




segunda-feira, 7 de setembro de 2015

Japonês tem quatro filhos

O título é uma paródia dos meus tempos de colegial com o Hino da Independência, tendo em vista que se a Pátria tem sido uma ‘mãe gentil’ para os senhores da casa grande, tem sido cruel madrasta para com os brasileiros que doaram sangue, suor e lágrimas para construí-la com muito amor.
Nos últimos dias vemos intensificada uma campanha de violência e ódio pelos porta-vozes da casa grande, prontamente repercutida pelos zumbis de uma classe média, que embora tenha acesso a escola, demonstra crassa ignorância em História, Política e Economia (além da Matemática e Português, por certo).
Os desfiles de comemoração da Independência ocorreram como de costume em todo o País, com a população olhando das arquibancadas.  Os que se julgam donos do País promoveram protestos contra o resultado das eleições, realizadas conforme previsto em Lei e na Constituição Federal. Os “enteados” reivindicaram seu direito a participar da festa em mais uma edição do Grito dos Excluídos.
Como vemos, 193 anos depois do Grito da Independência ainda não temos uma Pátria que acolha todos os brasileiros como uma ‘mãe gentil’.
Continuo a sonhar com este dia. É possível e só depende de cada um de nós.

terça-feira, 1 de setembro de 2015

Chegou setembro

Chegou setembro e com ele vão explodindo pelo campo as flores dos ipês (por aqui, os amarelos) num espetáculo de deixar a gente embasbacado e ciente de nossa pequenez diante da majestade da Natureza.
O agosto de vaticínios tenebrosos ficou para trás.
A vida pulsa com força em milhões de brasileiros empenhados em construir um novo tempo, fundado no amor, na justiça, na solidariedade, no respeito às diferenças, na oportunidade para todos, tendo justamente na Natureza sua maior mestra.
Evidentemente, ignorados por uma parte da sociedade que desconhece o valor do trabalho e ignora sua história e geografia.
Mas este povo tá aí, arrostando as dificuldades com criatividade e disposição, dando lição em muitos que se acham letrados e informados.
E eu tou de volta à estrada para aprender com eles e me maravilhar como quando vejo a floração dos ipês se renovando a cada ano.
Tudo igual, tudo novo outra vez.

terça-feira, 30 de junho de 2015

E a vida continua...

Zé Chagas.
Nos deixou, hoje.
"Fazer o que?"
Saudade!

Fim de semestre... e a vida ainda pulsa.

Num post de 18/12/2014, aqui no blog, disse que os próximos dias não seriam fáceis, referindo-me ao que nos esperava em 2015.
Estava sendo otimista. Ignorei a História.
As atrocidades cometidas, sem pejo, pelos donos da casa grande sempre que sentem a sombra de ter de dividir com o resto da sociedade o poder e privilégios que consideram seu por direito divino.
O vergonhoso papel da imprensa desinformando, difamando, manipulando, disseminando o ódio, perfeita porta-voz dos donos do poder, repetindo papel tantas vezes já desempenhado.
A polícia, ministério público e justiça perdem oportunidade única de total autonomia para investigar e punir as práticas corruptas que nos acompanham desde 1500, trocando-a pelas manchetes e prêmios desta imprensa marrom.
Convocadas pela imprensa, multidões vão à rua pedir o imptman da presidenta, a volta dos militares, o retorno da ditadura e outras maravilhas, vestidas com a camisa da CBF. Só podia dar no que deu: a ridícula participação da seleção do Dunga, na Copa América.
E uma inexplicável e preocupante mudez do governo.
Mas o Apocalipse previsto não aconteceu, por maior que esteja sendo o empenho desta turma aí de cima. E o Lula continua como o único líder político lúcido desta terra descoberta por Cabral. E Dilma vai costurando saídas.
E a Marieta Severo mostrou que não é preciso levantar a voz pra enfrentar estas barbaridades. Basta falar a verdade com clareza.
Os dias não serão fáceis daqui pra frente. Mas dá pra enfrentá-los.
 "Eppur si muove!"

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

"- Que coincidência!..."

Chega um tempo aqui no semiárido em que as frutas abundam. Mangas, goiabas, cajus (quase dois terços do pedúnculo desperdiçados), cajás, siriguelas, umbus chegam a fazer lama.
Fartura que levou os órgãos de assistência técnica, as entidades e instituições que acompanham a agricultura familiar a procurar meios que permitissem seu aproveitamento, agregando valor e gerando renda para agricultoras e agricultores, possuidores já de receitas de doces, sorvetes, geleias, algumas gozando até de justa fama. 
Capacitações em processamento, boas práticas de fabricação, organização e gestão deixaram um saldo de empreendimentos aptos a fornecer produtos de qualidade, com sabor local, conquistando clientes. Uma das estrelas, as polpas de frutas, cujos ingredientes estavam ali disponíveis pelo custo da coleta.
No uso de suas atribuições, em 15 de março de 2000, a ANVISA publica a RDC nº 23, que dispõe sobre "Procedimentos Básicos para Registro e Dispensa da Obrigatoriedade de Registro de Produtos Pertinentes à Área de Alimentos". Nesta resolução o produto "polpa de frutas" é dispensado da obrigatoriedade de registro, com o código 4300181. Uma situação que atendia as necessidades da agricultura familiar, permitindo a regularização de seus empreendimentos sem grande burocracia.
Com o surgimento do PAA, em 2003, a polpa de fruta foi um dos campeões de venda da agricultura familiar nesta modalidade, permitindo o melhoramento e ampliação de suas estruturas produtivas, com vantagens para os produtores e consumidores.
E muitos estudantes tiveram saudável melhora em suas merendas, livrando-se dos preparados sólidos artificiais para refresco, de sabor padronizado e nulo valor nutricional.
Os bons resultados das operações do PAA levaram o governo federal a determinar que no mínimo 30% dos recursos repassados pelo PNAE para a alimentação escolar deviam ser comprados diretamente da agricultura familiar. Um mercado gigantesco e já com dono.
Neste momento aparece uma nova regulamentação para a polpa de fruta. Com o decreto nº 6871, de junho de 2009, que atualiza a regulamentação da Lei 8.918/1994, a polpa de fruta foi considerada bebida, sendo portanto obrigada ao registro do estabelecimento e do produto no MAPA. A quase totalidade dos empreendimentos da agricultura familiar dedicados à sua produção ficou na ilegalidade. 
Fácil de imaginar as consequências.
Algumas entidades executoras do PNAE ainda lançaram chamadas públicas considerando os termos da Resolução nº 23/2000.
Mas, superando uma histórica falta de fiscais agropecuários, o MAPA empreendeu uma eficiente ação de visitas aos empreendimentos da agricultura familiar, comunicando-lhes sua inadequação à legislação, portanto sem condições de acesso ao mercado. Orientavam sobre os passos necessários para registro do estabelecimento e dos produtos, uma via sacra burocrática custosa em tempo e dinheiro. Para alegria das delvales (CocaCola) da vida, que comemoraram o afastamento de tão incômodo concorrente.
Pois é. Como o Ciro Monteiro já descobrira no velório de um sambista lá pelos anos 1950, não era uma 'coincidência'.

ANVISA - Agencia Nacional de Vigilância Sanitária <> RDC - Resolução da Diretoria Colegiada
PAA - Programa de Aquisição de Alimentos <> PNAE - Programa Nacional de Alimentação Escolar
MAPA - Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento

sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Falando em seca...

Os dados do prognóstico climático para a quadra chuvosa de 2015, no Ceará, divulgado na última terça-feira (20) pela Fundação Cearense de Recursos Hídricos (Funceme), apontam 64% de probabilidade das chuvas ficarem abaixo da média este ano. Pelo quarto ano consecutivo.
Logo após o anúncio o governador anunciou a intensificação de ações como a instalação de cisternas de placa, adutoras emergenciais e de engate rápido, perfuração de poços profundos, construção de novas barragens e ampliação da operação carros-pipa do Exército e do Estado. 
É um roteiro que tem se repetido desde 1877, quando o imperador D. Pedro II prometeu empenhar até as joias da coroa para que os nordestinos não morressem de fome e deu início à indústria das secas. Que tem sabido se atualizar e até hoje está viva.
Ações de emergência ao longo dos tempos têm superado ações de convivência. Coisas do sistema: na emergência, lucro e poder para alguns, na convivência poder e benefícios para todos.
Felizmente, o povo nordestino começa a se articular e construir formas de convivência com seu clima. Dentro da noção de que a água é patrimônio e bem necessário para todas as formas de vida, e não apenas um recurso a ser comercializado. Reinventando o modelo proposto desde sempre.
Mas, neste ano de 2015, a escassez de água atinge também a Região Sudeste, incluindo as mais populosas cidades brasileiras.
Não por falta de aviso.
Alckmin, o escorregadio, corre atrás do governo central pedindo ajuda, repetindo o que fizera o Senador Pompeu, em 1877, com o imperador. Ou seja, corremos o risco de ver alastrada a indústria da seca.
Que os nossos irmãos do Sudeste possam aprender com os irmãos nordestinos que esta crise só será superada com uma intensa participação popular no gerenciamento da água, parte de um ciclo vital da Natureza. Crise que não será resolvida com obras emergenciais, transposição de bacias e coisas do gênero, mas com uma mudança profunda neste modelo de civilização que consideram tão 'superior'.
Só assim, terão água quando vier a precisão.

quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

O sol é para todos?

O sol é a fonte de energia que movimenta toda vida no nosso planeta Terra.
Está presente em todos os cantos de nosso país, com abundância aqui em nossa região.
Entretanto, sua utilização como fonte de energia tem se limitado a experiências esparsas, desconectadas entre si e quase sempre de forma experimental e assistemática.
Por que?
Acredito que desde que em determinado instante da história da humanidade, quando o ser humano inventou a propriedade privada, essas coisas que podem estar ao alcance de todos começaram a ser desvalorizadas. Uma fonte de energia barata, limpa, renovável, ao alcance de todos poderia causar grandes prejuízos a empresas que tem sua razão de ser na venda desse insumo fundamental.
Já imaginou o quanto de energia não precisaria ser comprada das distribuidoras se o aquecimento de água de condomínios de luxo, clubes e indústrias utilizasse esta forma abundante e disponível de energia?
Com uma tecnologia ao alcance de qualquer estudante de curso colegial.
Pequena atitudes podem mudar o mundo.
Com certeza, muitas discussões acontecerão este ano sobre os caminhos da nossa economia.
Todas privilegiando soluções que trarão lucros a alguns, deixando a conta para todos.
E procurando demonstrar por a mais b que soluções baratas, baseadas nos conhecimentos locais, são uma fonte de atraso e ineficiência.
Abramos os olhos e deixemos o sol iluminar nossas vidas.
Um 2015 de muita luz, alegria e realizações e também de um bom inverno, que tá nos fazendo grande falta.