Ao procurar alimentos saudáveis, produzidos em comunhão com
a Natureza pela agricultura alternativa ao modelo industrial vigente, o
consumidor se depara com uma série de denominações que podem deixá-lo confuso
quanto ao significado e pertinência. Vamos tentar entender porque.
Desde o início da química agrícola, em diferentes regiões do
Planeta, diversos estudiosos criticaram a maneira reducionista e positivista de
empregar os conhecimentos adquiridos pela Ciência na produção agrícola. Achavam
o modelo manco, por ignorar as incontáveis interações biológicas existentes nas
relações entre o solo, a planta, o ambiente, a fauna e o homem.
O contrário deste
modelo era adotar um enfoque holístico, que promovesse a agrobiodiversidade e
os ciclos biológicos na unidade de produção, procurando sua sustentabilidade
ambiental, econômica e social, no espaço e no tempo.
Ou seja, a propriedade agrícola é considerada uma unidade
indivisível, onde todas as atividades seriam parte de um corpo dinâmico
interagindo entre si. Seria um organismo
agrícola, um sistema onde o todo é maior que a soma das partes. Daí a
origem do termo agricultura orgânica.
De organismo agrícola.
Este nome foi adotado pela Federação Internacional dos
Movimentos de Agricultura Orgânica (IFOAM, do inglês) que sistematizou os
princípios que orientavam o movimento: saúde, ecologia, justiça social
(equidade) e precaução. E definiu normas de produção, orientadas por estes
princípios, que forneceram as bases para sistemas de certificação exigidos pelo
mercado.
De cara os representantes da agricultura industrial
questionaram a utilização do termo pelos movimentos de agricultura alternativa,
alegando que, mesmo com o uso de insumos industriais, aconteciam os processos
biológicos e orgânicos na agricultura convencional. A discussão chegou aos
tribunais, que deram ganho de causa aos movimentos, garantindo a utilização do
nome Agricultura Orgânica (AO) como exclusividade de um modelo de agricultura
não-convencional, praticado num organismo agrícola.
A legislação brasileira adota o termo “orgânico” como coletivo
das várias escolas que praticam este modelo de agricultura: biodinâmica,
orgânica, biológica, natural, ecológica, permacultura, regenerativa,
sustentável, ou qualquer outro que siga os mesmos princípios.
E onde entra o agroecológico?
Na polêmica citada acima, alguns defensores da agricultura
alternativa defenderam a adoção do termo Agricultura Ecológica (AE) como uma
maneira de escapar dos problemas levantados pela indústria. Pessoalmente, acho
que o reconhecimento pela Justiça da propriedade de utilizar o termo
Agricultura Orgânica foi muito importante por aceitar o conceito de organismo
agrícola, marcando a diferença entre uma agricultura baseada em insumos, de
outra baseada em processos. Os termos orgânico e agroecológico se entrelaçam em
sua origem. E muitas vezes são usados como sinônimo, embora nem sempre com
propriedade.
O crescimento explosivo da demanda por este tipo de
alimento, sem o correspondente aumento da oferta, provocou uma melhor remuneração,
atraindo muitos produtores, interessados apenas em cumprir as normas para conseguir
uma certificação e participar deste mercado. Em detrimento de uma observância rigorosa dos
princípios, em especial o da ecologia. Uma agricultura de insumos orgânicos, ao
invés de processos orgânicos.
Por outro lado, o desastre ambiental provocado pela
agricultura industrial (e pelo conceito de desenvolvimento e seu modelo) fez
surgir com força a preocupação com a ecologia e muitas discussões sobre um novo
modelo de exploração agrícola. Surge então o termo Agricultura Sustentável,
solução encontrada pelos países ricos para não adotar a Agricultura Orgânica
como paradigma, temendo prejudicar sua indústria.
Neste contexto aparece a Agroecologia, uma Ciência nova que
utiliza conceitos da agronomia, ecologia, economia e sociologia, com limites teóricos
bem definidos, propondo o desenho de sistemas agrícolas mais integrados, abordando
as biointerações que aí ocorrem, os impactos da agricultura nos ecossistemas e
as questões sociais que envolvem a produção agrícola. Uma abordagem holística, para um modelo de agricultura que responda às necessidades atuais de
alimentos saudáveis, respeitando os limites dos ecossistemas e promovendo o bem
estar de todos os seres vivos do Planeta. Isto é, um marco conceitual de uma agricultura sustentável em suas dimensões ecológica, econômica e social, definindo caminhos, mas não impondo regras ou normas.
Complicado? Não, complicada é a vida. Continuaremos nosso
papo.
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